Prensa
América Latina vê crescimento de ''esquerda pragmática''
Fuente: Folha de São Paulo (Brasil)
Raul Juste Lores, da reportagem local
A vitória do esquerdista Rafael Correa no Equador, admirador do presidente venezuelano Hugo Chávez, reacendeu o debate sobre a guinada à esquerda na América Latina e a influência do chavismo.
Nos últimos meses, candidatos apoiados por Chávez no Peru e no México foram derrotados, o que foi interpretado por muitos como um limite para a influência do presidente venezuelano. Mas a vitória do sandinista Daniel Ortega na Nicarágua, e de Correa, no Equador, mostra que Chávez não está só.
Vários analistas políticos latino-americanos ouvidos pela Folha, no entanto, vêem mais do que o embate de países sob a órbita da Venezuela e os mais pró-americanos.
O que está em alta na região é o pragmatismo. Vários governos de centro-esquerda se demonstram receptivos ao investimento estrangeiro, mantêm boas relações com os EUA e não reverteram as reformas econômicas dos anos noventa.
Ao mesmo tempo, priorizam um discurso social com programas de distribuição de renda para milhões de pobres que pouco ganharam com as reformas econômicas neoliberais.
Com exceção da Argentina, que depois de uma severa crise e de várias reformas desastradas, precisou tomar medidas de exceção (e até reestatizou privatizações malfeitas), os demais novos esquerdistas convivem bem com o legado da abertura econômica e das privatizações da década passada.
Apesar da admiração por Chávez, Correa deve adotar esse figurino. "Na campanha do segundo turno, ele adotou um tom mais moderado e até elogiou Lula e a presidente chilena Michelle Bachelet. E já anunciou que não reverterá a dolarização", diz o chileno Patricio Navia, professor de Ciência Política da Universidade Diego Portales, de Santiago.
"Correa precisa gerar confiança nos investidores estrangeiros e nos empresários locais, mas deve tomar medidas drásticas para alterar a ordem institucional", diz.
Essa promessa de alterar a ordem política - na campanha ele prometeu convocar uma Assembléia para refazer a Constituição do país - fazem Correa pertencer ao grupo da esquerda "refundadora".
Chávez, Correa e o presidente boliviano Evo Morales têm em comum, além do discurso antiamericano e antineoliberal, a vontade de recriar o sistema político e as instituições de seus países.
Morales também convocou uma Assembléia Constituinte para preparar uma nova Constituição, como Chávez fez no início de seu governo.
Nem Chile, nem Chávez
Talvez essa seja a maior diferença entre os refundadores e a centro-esquerda. "Não há nenhum país na região tão liberal quanto o Chile, nem outro com uma retórica tão violenta quanto Chávez. Todos os demais países estão posicionados entre os dois, com certo receio dos dois modelos. Até Morales tem um discurso interno duro e outro mais moderado no exterior", diz o analista político argentino Gabriel Salvia, diretor do Centro para o Desenvolvimento da América Latina, uma ong de Buenos Aires.
Os analistas políticos dizem que, com a reeleição de Lula, o presidente brasileiro pode voltar a dirigir sua atenção aos problemas regionais, mediando grupos diferentes.
É no plano das políticas comerciais e alinhamentos internacionais que essas especulações sobre ideologias ficam mais concretas - e um dos blocos que surgia com mais força na AL era o de países que assinavam tratados bilaterais de comércio com os EUA.
Com a vitória dos democratas no Congresso, tradicionalmente mais protecionistas, essa Alca gradual se desacelera. Com tratados de livre comércio na geladeira, os blocos regionais ganham mais força.
Folha de Sao Paulo, 28/11/2006
Folha de São Paulo (Brasil)
Raul Juste Lores, da reportagem local
A vitória do esquerdista Rafael Correa no Equador, admirador do presidente venezuelano Hugo Chávez, reacendeu o debate sobre a guinada à esquerda na América Latina e a influência do chavismo.
Nos últimos meses, candidatos apoiados por Chávez no Peru e no México foram derrotados, o que foi interpretado por muitos como um limite para a influência do presidente venezuelano. Mas a vitória do sandinista Daniel Ortega na Nicarágua, e de Correa, no Equador, mostra que Chávez não está só.
Vários analistas políticos latino-americanos ouvidos pela Folha, no entanto, vêem mais do que o embate de países sob a órbita da Venezuela e os mais pró-americanos.
O que está em alta na região é o pragmatismo. Vários governos de centro-esquerda se demonstram receptivos ao investimento estrangeiro, mantêm boas relações com os EUA e não reverteram as reformas econômicas dos anos noventa.
Ao mesmo tempo, priorizam um discurso social com programas de distribuição de renda para milhões de pobres que pouco ganharam com as reformas econômicas neoliberais.
Com exceção da Argentina, que depois de uma severa crise e de várias reformas desastradas, precisou tomar medidas de exceção (e até reestatizou privatizações malfeitas), os demais novos esquerdistas convivem bem com o legado da abertura econômica e das privatizações da década passada.
Apesar da admiração por Chávez, Correa deve adotar esse figurino. "Na campanha do segundo turno, ele adotou um tom mais moderado e até elogiou Lula e a presidente chilena Michelle Bachelet. E já anunciou que não reverterá a dolarização", diz o chileno Patricio Navia, professor de Ciência Política da Universidade Diego Portales, de Santiago.
"Correa precisa gerar confiança nos investidores estrangeiros e nos empresários locais, mas deve tomar medidas drásticas para alterar a ordem institucional", diz.
Essa promessa de alterar a ordem política - na campanha ele prometeu convocar uma Assembléia para refazer a Constituição do país - fazem Correa pertencer ao grupo da esquerda "refundadora".
Chávez, Correa e o presidente boliviano Evo Morales têm em comum, além do discurso antiamericano e antineoliberal, a vontade de recriar o sistema político e as instituições de seus países.
Morales também convocou uma Assembléia Constituinte para preparar uma nova Constituição, como Chávez fez no início de seu governo.
Nem Chile, nem Chávez
Talvez essa seja a maior diferença entre os refundadores e a centro-esquerda. "Não há nenhum país na região tão liberal quanto o Chile, nem outro com uma retórica tão violenta quanto Chávez. Todos os demais países estão posicionados entre os dois, com certo receio dos dois modelos. Até Morales tem um discurso interno duro e outro mais moderado no exterior", diz o analista político argentino Gabriel Salvia, diretor do Centro para o Desenvolvimento da América Latina, uma ong de Buenos Aires.
Os analistas políticos dizem que, com a reeleição de Lula, o presidente brasileiro pode voltar a dirigir sua atenção aos problemas regionais, mediando grupos diferentes.
É no plano das políticas comerciais e alinhamentos internacionais que essas especulações sobre ideologias ficam mais concretas - e um dos blocos que surgia com mais força na AL era o de países que assinavam tratados bilaterais de comércio com os EUA.
Com a vitória dos democratas no Congresso, tradicionalmente mais protecionistas, essa Alca gradual se desacelera. Com tratados de livre comércio na geladeira, os blocos regionais ganham mais força.
Folha de Sao Paulo, 28/11/2006